Entre Versos e Sentimentos: A Ligação Poética entre Lana Del Rey e Sylvia Plath
As letras de Lana Del Rey têm uma qualidade poética marcante, repletas de imagética e descrições sensoriais que evocam emoções profundas, semelhantes às metáforas presentes na poesia. Muitas de suas músicas possuem um tom autobiográfico, capturando melancolia e nostalgia, características da poesia confessional.
A inspiração de Lana em Sylvia Plath é evidente em vários aspectos de suas letras e poemas. Plath, uma das poetas mais influentes do século XX, é conhecida por seu estilo intenso e emocional, que aborda temas como identidade, amor, perda e a luta interna. Esses temas estão igualmente presentes nas letras de Lana.
Complexidade das Emoções Humanas
As letras de Lana frequentemente refletem uma vulnerabilidade crua, assim como os poemas de Plath. Ambas as artistas utilizam simbolismo forte, empregando objetos ou figuras para representar emoções e ideias mais amplas.
Lana é inspirada por diversas figuras da literatura americana, sempre cultivando uma aura de melancolia e introspecção em suas letras. Ela expressa suas inseguranças e anseios, refletindo os sentimentos de solidão e busca por aceitação encontrados também na obra de Plath. Temas como amor perdido e a luta pela liberdade aparecem tanto nas letras de Lana quanto na poesia de Sylvia.
Imagens Visuais e Lutas Internas
Lana utiliza metáforas e simbolismos que evocam uma sensação de nostalgia e beleza trágica, semelhante ao modo como Plath descreve suas experiências pessoais com um toque quase cinematográfico.
Um aspecto importante é a luta contra as expectativas sociais e os papéis impostos às mulheres. Plath frequentemente explorava as pressões da sociedade sobre a feminilidade, e Lana também aborda questões semelhantes em suas músicas. A personagem feminina que ela cria em suas canções muitas vezes reflete essa luta interna entre o desejo de ser livre.
Um exemplo claro disso pode ser encontrado em “Fingertips”, onde Lana aborda questões profundas sobre maternidade, responsabilidade e insegurança. O trecho da música reflete preocupações sobre o futuro e o papel de ser mãe, tocando na luta interna e no estigma em torno da saúde mental. A pressão social que muitas mulheres sentem em relação à maternidade e ao que significa ser uma mãe “adequada” é um tema recorrente.
“Charlie, pare de fumar
Caroline, você estará comigo?
A bebê vai ficar bem?
Eu vou ter um meu?
Eu vou dar conta mesmo se eu tiver?
É dito que minha mente
Não é apropriada, ou assim disseram, para carregar uma criança
Eu acho quе ficarei bem”
Ou, se voltarmos alguns anos, podemos relembrar o monólogo de “Ride”, apresentado no clipe da música, onde a liberdade é explorada de maneira visceral. Lana compartilha seu desejo de escapar das limitações, transmitindo uma autenticidade que ressoa com a busca por identidade e auto aceitação.
“E o meu lema é o mesmo de sempre –
Eu acredito na bondade de estranhos.
E quando eu estou em guerra comigo mesmo – eu dirijo.
Eu só dirijo.Quem é você?
Você está em contato com todas as suas fantasias mais sombrias?
Você criou uma vida para si mesmo onde você está livre para experimentá-las?
Eu criei! Eu sou louca pra caralho, mas sou livre! “
Reflexões sobre Amor e Expectativas
Em uma entrevista para a Rolling Stone UK em 2023, Lana menciona Sylvia e algumas dessas questões. Em sua faixa-título e primeiro single do álbum “Did you know that there’s a tunnel under Ocean Blvd,” ela pergunta ansiosamente: “Quando será a minha vez?” Embora essa pergunta se refira a experiências pessoais, a temática de maternidade e a busca por amor aparecem no álbum.
Quanto aos anseios maternos, ela cita a passagem de A Redoma de Vidro quando a protagonista de Sylvia Plath considera a árvore metafórica das escolhas de vida que uma mulher enfrenta: “Casamento, filhos, opções de carreira e assim por diante. Eu queria todos e cada um deles, mas escolher um significava perder todo o resto, e, enquanto eu estava ali sentada, sem conseguir decidir, os figos começaram a enrugar e a ficar pretos, e, um por um, caíram no chão, ao mesmo tempo, em meus pés”, escreveu Plath.
“É tipo a figueira”, diz Lana.
“Como a Sylvia Plath, se eu não colher um deles primeiro, todos eles vão murchar e não vai sobrar nenhum pra escolher.”
Conexões Diretas
A música “hope is a dangerous thing for a woman like me to have – but I have it” é uma das mais evidentes, na qual Lana cita Sylvia Plath. Ela chegou a postar um trecho da música com o nome de “Sylvia Plath” mas posteriormente mudou. A capa do single, a primeira foto presente nesse texto, também é uma referência a Plath.
“I’ve been tearing around in my fucking nightgown
24/7 Sylvia Plath
Writing in blood on the walls
‘Cause the ink in my pen don’t work in my notepad”“Eu tenho corrido por aí com a porra da minha camisola
24 horas por dia, Sylvia Plath
Escrevendo em sangue nas paredes
Porque a tinta da minha caneta não funciona no meu caderno.”
Sylvia Plath também menciona uma camisola em seu poema “Morning Song”.
“Um grito, e eu tropeço para fora da cama, pesada como uma vaca e floral / No meu camisolão vitoriano”.
Essa música destaca a conexão entre as experiências de ambas as artistas e suas lutas com temas como esperança e desespero, além de remeter à pressão social e à dor pessoal em seus versos.
Lana também dedica o poema “Patent leather do-over” a Plath, fazendo referência a uma passagem de “The Bell Jar” nos versos:
“Sylvia, I knew what you meant when you talked about swimming in the ocean and leaving your patent leather black shoes pointed towards it while you swam. It tickled you to leave them there.”
“Sylvia, eu entendia o que você queria dizer ao falar sobre nadar no oceano e deixar seus sapatos de couro envernizado pretos voltados para ele enquanto você nadava. Era divertido deixá-los ali.”
Em Violet Bent Backwards over the Grass, seu livro de poesia, Lana mescla a poesia beat de Kerouac e Allen Ginsberg com o nacionalismo de Whitman, revisitando temas de T.S. Eliot, Nabokov e Robert Frost. Apesar de uma rica rede de influências, a presença de Sylvia Plath é a mais notável em temática e estética.
Lana menciona diretamente Plath em seus versos em “Bare feet on linoleum”:
“Stay on your path Sylvia Plath/don’t fall away like all the others”.
“Mantenha-se em seu caminho, Sylvia Plath / Não se desvie como os outros.”
O suicídio de Sylvia viria a ser um tema que ramificaria na arte de Lana, e a mesma até coloca, ao lado desse poema, uma imagem de um fogão — lembrando que Plath suicidou-se com a ingestão de gás no forno do fogão de sua casa —. Assim como Sylvia, Lana fala abertamente de si em seus poemas, e se usa metáforas para alguns versos, e no seguinte ela desnuda em um verso duro e literal.
“É uma espécie de poesia profunda, onde tudo é permitido e é totalmente livre. Às vezes, minhas páginas terminam com um dístico, logo no final, mas a maior parte é de formato livre”, diz Lana sobre sua escrita em seu livro.
Lana já citou The Bell Jar, o romance de Plath, como um de seus favoritos, e “Ariel” como uma de suas coleções de poesia mais queridas. Lana, em quase toda a sua poesia, utiliza o ‘Spoken Word’ (Declamação) para transmitir um sentimento de desabafo e intimidade. Essa forma de expressão geralmente permite uma vulnerabilidade.
A relação entre Lana Del Rey e Sylvia Plath vai além da influência; elas compartilham experiências, sensibilidade e uma visão de mundo única através de seus talentos. A poesia nas letras de Lana não é apenas uma homenagem ou inspiração, mas também uma continuidade do diálogo sobre as complexidades da vida, amores, frustrações, a busca por identidade, liberdade e as expectativas sociais que moldam a experiência feminina.