Quem Ama L.A.
Los Angeles, cidade na Califórnia, tem sido muito mais do que isso na carreira de Lana Del Rey, com destaque para o álbum Norman Fucking Rockwell! (2019), em aniversário hoje (30/08). Ao longo de sua trajetória, passou de um sonho, a representação de sua fama, Hollywood, até um ponto de quebra e desmoronamento de tudo o que significava.
California
I’m coming for ya
California
I’m coming for ya— California, não lançada oficialmente
Hollywood
Um fator essencial para explicar como Los Angeles está presente numa história contínua através de suas músicas é o Americana, estética estadunidense que reúne o glamour de valores americanos, nostalgia e símbolos passados. Outro fator é reconhecer o sonho de Lana Del Rey na juventude de alcançar a fama, que pode ser representado por Hollywood, em Los Angeles.
Nada poderia simbolizar mais esses valores do que o cinema americano centrado em Hollywood, e Lana utilizou disso não só como artifício para suas letras, mas também em sua vida pessoal.
Em “West Coast”, do álbum Ultraviolence (2014), Lana canta: “Down on the West Coast, they got a sayin’ / If you’re not drinkin’ then you’re not playin’”. Ela captura a atmosfera hedonista de Los Angeles, onde a vida seria uma festa interminável, mas com uma subcorrente de vazio e superficialidade (onde começa a perceber o lado ruim de sua nova vida). “West Coast” se torna um microcosmo do sonho californiano: brilhante por fora, mas com uma escuridão interna que devora aqueles que se deixam levar.
Los Angeles em Chamas
Tudo começa a tomar um rumo em Norman Fucking Rockwell! (2019), quando Lana começa a expor com mais ênfase o que significava a cidade para ela. Em “Fuck It I Love You”, ela canta:
I moved to California but it’s just a state of mind / It turns out everywhere you go, you take yourself, that’s not a lie
A letra capta a ironia de Los Angeles: uma cidade que promete a reinvenção e o sucesso, mas que, no fundo, revela que a verdadeira mudança deve vir de dentro. A desilusão de Lana com o sonho californiano é palpável, e Los Angeles se torna o símbolo perfeito desse desencanto. Em “The Greatest”, do mesmo álbum, temos a sentença final:
L.A. is in flames, is getting hot
Los Angeles se revela um símbolo para explorar a tensão entre o passado idealizado e o presente desiludido. No ápice de toda a trajetória de sua carreira e a história americana, junto ao tema do álbum, Lana mostra a decadência do Sonho Americano e dos Estados Unidos, que antes também era o seu sonho de fama. A frase também referencia a capa do álbum, já que, no fundo, é possível ver Los Angeles em um incêndio, que não só diz sobre essa decadência, mas também menciona os incêndios selvagens que estavam ocorrendo na época — vale lembrar o engajamento de Lana em questões ambientais e humanitárias desde o álbum anterior a este, Lust For Life (2017) —.
Em seu álbum seguinte, Chemtrails Over The Country Club (2020), temos uma visão que nos diz os cursos que Lana segue agora:
I only mention it ’cause I’m ready to leave L.A.
LA Who Am I To Love You
Depois de tudo, ela se prepara para deixar Los Angeles, o que coincide com o abandono de sua velha persona e a introdução de um Lana mais intimista e real. Chega-se, então, no ponto de maior exposição do tema: o poema “LA Who Am I To Love You”, de seu livro de poesias Violet Bent Backwards Over The Grass, do mesmo ano.
Nesse poema, Los Angeles é com quem Lana conversa, a personagem que ela coloca em um pedestal e se coloca abaixo como alguém que não merece essa cidade.
I’m not even from here, I’m from the East Coast, somewhere from the valley
Essa linha sugere uma desconexão entre a narradora e a cidade, como se ela estivesse tentando se enraizar em um lugar que não a reconhece completamente. Assim ela se desvincula do seu próprio sonho depois de ter experimentado dele e seu sabor agridoce. A fama agora não é mais algo tão fantástico e depois disso, ela busca novos caminhos. Lana explora a ideia de que o amor por Los Angeles é, na verdade, um reflexo do desejo de se sentir amada e aceita:
But LA, I’m yours
A entrega à cidade é, ao mesmo tempo, uma busca por identidade e uma tentativa de preencher o vazio interno.
O Corpo Como Mapa
Prosseguindo com a narrativa paralela à linha principal de sua carreira, no álbum Blue Banisters (2021) canta como se sintetizasse nesse álbum um compilado de sensações cruas e experiências de sua vida em seu álbum mais pessoal. Na música “Arcadia” Lana canta:
My body is a map of LA
O que não somete reflete toda a sua vida até então, mas também mostra que ela tinha a visão clara do que significava LA e a Califórnia para ela, descartando a possibilidade de ser tudo uma coincidência. LA como o destino de tudo o que ela buscava, e no fim encontrando dentro de si mesma.
Há essa linha narrativa sutil e quase imperceptível construída inocentemente no início de sua trajetória que vai se tornando um aspecto fundamental para a pessoa que ela se tornaria dos últimos tempos para cá. Não é algo que poderia ser planejado, mas habilidosamente guiado a partir de certo ponto até o ápice da arte.